TUTELA ANTECIPADA ANTECEDENTE E SUA ESTABILIZAÇÃO



*Este texto é uma pequena parte do material de Direito Processual Civil elaborado por mim para os cursos do MEGE (http://www.mege.com.br/). Nos referidos cursos, os alunos matriculados ganham o material completo de todas as matérias para preparação para concursos.

*Material elaborado com base nos livros e curso:

  • Curso de Direito Processual Civil – Volume I – Teoria geral do direito processual civil, processo de conhecimento e procedimento comum – Humberto Theodoro Júnior – 57. ed. rev. atual. e ampl. – Rio de Janeiro: Forense, 2016.
  • Manual de direito Processual civil – Volume único – Daniel Amorim Assumpção Neves –  8. ed. – Salvador: Ed. JusPodivm, 2016.
  • Curso online OAB-MG ministrado pelo professor Ival Heckert.Sem título

TUTELA ANTECIPADA/ANTECIPATÓRIA REQUERIDA EM CARÁTER ANTECEDENTE

Art. 303 e 304 do NCPC.

Justifica-se essa abertura do processo a partir apenas do pedido de tutela emergencial, diante da circunstância de existirem situações que, por sua urgência, não permitem que a parte disponha de tempo razoável e suficiente para elaborar a petição inicial, com todos os fatos e fundamentos reclamados para a demanda principal. O direito se mostra na iminência de decair ou perecer se não for tutelado de plano, razão pela qual merece imediata proteção judicial. O novo Código admite, portanto, que a parte ajuíze a ação apenas com a exposição sumária da lide, desde que, após concedida a liminar, adite a inicial, em quinze dias ou em outro prazo maior que o órgão jurisdicional fixar, com a complementação de sua argumentação e a juntada de novos documentos (art. 303, § 1º, I).

Procedimento:

Petição inicial: conforme já visto, o autor poderá ingressar em juízo limitando-se ao requerimento da tutela provisória satisfativa e procedendo apenas à indicação do pedido de tutela final, que posteriormente poderá formular por emenda, se for o caso. Não será formulado o pedido principal, isto é, aquele que seria o objeto do processo definitivo. Da inicial constará, também, a exposição sumária da lide, do direito a que se busca realizar e do periculum in mora. É evidente que, por se tratar de procedimento antecedente, a petição deverá indicar o juiz competente, as partes com sua qualificação, as provas com que o autor pretende demonstrar a verdade dos fatos alegados (NCPC, art. 319), bem como o valor da causa, que deverá levar em consideração o pedido de tutela final (art. 303, § 4º). Caberá ao autor indicar, ainda, que, diante da demonstração dos requisitos do art. 303, caput, pretende valer-se dos benefícios da tutela provisória satisfativa (art. 303, § 5º). Por fim, o autor deverá adiantar o pagamento das custas e despesas processuais (art. 82) ou requerer a gratuidade de justiça já neste momento.

Análise da inicial: após analisar a inicial, o juiz, reconhecendo a urgência da medida, tomará uma das seguintes deliberações: (a) Deferirá liminarmente o pedido (art. 300, § 2º). (b) Ou entendendo que a petição inicial está incompleta, por não apresentar elementos suficientes para a concessão da tutela antecipada (satisfativa), o juiz determinará a respectiva emenda, em cinco dias (art. 303, § 6º). Não efetuada a emenda, a petição inicial será indeferida e o processo extinto, sem resolução do mérito (art. 303, § 6º, in fine).

Obs.: No procedimento de tutela antecipatória, o NCPC não prevê citação e defesa do requerido antes da decisão sobre o pedido da medida urgente, a ser liminarmente solucionado. Se a pretensão à tutela antecipada, mesmo depois da emenda saneadora das deficiências da petição inicial, não apresentar condições para justificar a medida provisória satisfativa, o juiz a denegará e o processo se extinguirá, sem que o réu tenha sido citado. É sempre bom lembrar que o objeto da pretensão formulada na petição inicial, in casu, é a medida liminar inaudita altera parte, razão pela qual não há como se prosseguir depois que essa pretensão for denegada.

Denegada a tutela antecipada é cabível agravo de instrumento, conforme art. 1.015, I do NCPC.

Deferida a tutela antecipada antecedente:

  1. Intima-se o autor para, no prazo de 15 dias ou outro prazo que o juiz indicar, aditar a petição inicial (art. 303, § 1º, I) fazendo o pedido principal e juntando novos documentos.
  2. O juiz mandará citar o réu, e designará audiência de conciliação ou mediação nos termos do art. 334 (art. 303, § 1º, II).

Discussão doutrinária acerca da concomitância ou não entre os prazos de intimação do autor para aditar a petição inicial e o prazo para citar e intimar o réu:

Obs.: Todos os caminhos apresentados por estas correntes se dão em razão de que não se sabe se o réu interporá o agravo de instrumento ou não da decisão concessiva da tutela antecipada, e, portanto, não haverá como saber se a audiência ocorrerá ou não, se haverá estabilização da decisão ou não.

1ª corrente: intimação do autor para aditar a inicial antes da citação e intimação do réu como regra – após o aditamento feito pelo autor é que o réu será citado e intimado da audiência. Para esta corrente não faz sentido o réu ser citado para contestar ou intimado para audiência sem que o autor tenha aditado a petição inicial, pois neste caso o réu não conheceria de pleno a extensão das postulações que contra si são feitas pelo autor. Apenas naqueles casos em que a intimação do réu acerca da tutela concedida mostra-se urgente é que ela se dará concomitantemente ou mesmo antes da intimação do autor. Neste último caso, porém, a citação e intimação terão seu escopo limitado à integração do réu ao polo passivo e ao cumprimento da decisão concessiva da tutela, devendo efetuar-se a intimação do réu para comparecimento à audiência de conciliação ou mediação apenas após o aditamento da petição inicial pelo autor.

2ª corrente: há concomitância dos prazos. Como se vê a lei é silente quanto ao momento da citação, se imediatamente ou após o aditamento. Diante do silêncio, a melhor interpretação é a de que é imediata. Na verdade, haverá citação e intimação não só para a audiência, como previsto na norma, como também da tutela antecipada deferida, abrindo-se ao réu a possibilidade de recorrer dessa decisão por meio de agravo de instrumento (art. 1.015, I). O prazo para contestar, no entanto, somente será contado, nos termos do art. 335, após a audiência ou o protocolo do pedido de cancelamento feito pelo réu, caso tenha agravado, pois o processo seguirá normalmente tendo sido emendada a petição inicial pelo autor. Se interposto o agravo, mas não tiver sido emendada a petição inicial, a decisão concessiva da tutela antecipada não terá se estabilizado e o processo será extinto. Não interposto o agravo e não tendo havido a emenda da petição inicial, a decisão concessiva da tutela antecipada se estabilizou e o processo será extinto. Não interposto o agravo e tendo havido a emenda da petição inicial pelo autor, não se poderá presumir que com isso o autor abriu mão da estabilização da tutela antecipada. Ele deve ser intimado para que se manifeste sobre a continuidade do processo em busca da tutela definitiva ou se já está satisfeito com a tutela antecipada estabilizada e por isso não se opõe à extinção do processo.

3ª corrente: intimação do réu antes da intimação do autor para aditar a inicial. A concomitância dos dois prazos (de aditamento e de recurso) que a lei aparentemente prevê oferece uma dificuldade de interpretação, já que as consequências de ambos devem ser sucessivas e prejudiciais entre si. Com efeito, é bom lembrar que, se intimado da liminar, o réu não houver interposto recurso, o provimento provisório já terá se estabilizado (art. 304, caput). Nesse caso, não se poderá cogitar de aditamento da inicial, já que a sua função seria dar sequência ao processo no tocante à busca da solução final da pretensão de mérito. Exigir, nesta altura, do autor a tomada de providência somente compatível com a não estabilização da medida provisória, seria uma incongruência, seria forçar o andamento de uma causa cujo objeto já se extinguiu. Diante desse aparente impasse procedimental, a regra do inciso I, do § 1º do art. 303, deve ser interpretada como medida a ser tomada após o prazo reservado ao requerido para recorrer, prazo esse que o sistema da tutela antecipatória deve funcionar como oportunidade legal para ser apurada a sua aquiescência ou não do pedido do autor. Assim, os dois prazos em análise (o de aditamento e o de recurso) só podem ser aplicados sucessivamente e nunca simultaneamente. Foi justamente por isso que que o art. 303, § 1º, I, estipulou o prazo de 15 dias para o autor aditar a inicial, mas não disse, expressamente, de quando a respectiva contagem se iniciaria. A interpretação sistêmica, portanto, é a de que o prazo para aditar a inicial somente fluirá depois de ocorrido o fato condicionante, que é a interposição do recurso do réu contra a liminar. Sem o recurso do réu, não há aditamento algum a ser feito pelo autor: o processo se extinguiu ex lege (art. 304, § 1º).

Estabilização da Tutela Antecipada (art. 304 do NCPC) – deferida a tutela antecipada, da intimação desta decisão inicia-se o prazo de 15 dias para o réu interpor agravo de instrumento. Não sendo interposto o recurso mencionado o processo será extinto e a decisão concessiva da tutela antecipada torna-se estável, produzindo seus efeitos (não faz coisa julgada material). A nova codificação, portanto, admite que se estabilize e sobreviva a tutela de urgência satisfativa, postulada em caráter antecedente ao pedido principal, como decisão judicial hábil a regular a crise de direito material, mesmo após a extinção do processo antecedente e sem o sequenciamento para o processo principal ou de cognição plena.

  • Das três diferentes espécies de tutela provisória somente a tutela antecipada em caráter antecedente foi contemplada na fórmula legal de estabilização consagrada no art. 304 do NCPC. Há doutrina que entende ser aplicável a estabilização também para a tutela de evidência em interpretação extensiva, pois, assim como a tutela antecipada, aquela tem cunho satisfativo, resolvendo a crise de direito material a princípio, diferentes da tutela cautelar que possui cunho conservatório e não resolve a crise do direito material. Porém, até que os Tribunais superiores resolvam tal questão, deve-se adotar a literalidade da lei.
  • Tutela antecipada parcial: parte da doutrina entende cabível a estabilização no caso de deferimento parcial da tutela antecipada em caráter antecedente, procedendo como se faz no deferimento integral, quanto a esta parte deferida. Entretanto, parte da doutrina defende a não possibilidade de estabilização em razão de criar uma confusão procedimental, e, por questão de economia processual, não faz sentido ao final o juiz não fazer uma cognição exauriente e deixar de decidir com resolução de mérito a parcela que foi objeto de tutela antecipada.
  • Recurso do réu: para que não haja a estabilização da tutela antecipada concedida de forma antecedente, basta que o réu interponha agravo de instrumento no Tribunal respectivo. Esta é a literalidade da lei. Há doutrina defendendo que para a não ocorrência da estabilização bastaria tão somente uma impugnação (genérica) no próprio juízo prolator da decisão. Entretanto, em razão de ser mais uma novidade do NCPC, devemos aguardar o posicionamento dos Tribunais.
  • Vontade do autor: parte da doutrina entende que, mesmo o réu não agravando da decisão, pode o autor requerer expressamente que não haja a estabilização da tutela antecipada, pois pode preferir que haja cognição exauriente e o julgamento do mérito pelo juiz. Entretanto, tal entendimento não é pacífico na doutrina.
  • Litisconsórcio e assistência: havendo litisconsórcio passivo é possível que apenas um ou algum dos réus interponha recurso contra a decisão concessiva de tutela antecipada. Parte da doutrina entende que neste caso haverá afastamento da estabilização da tutela, independentemente da inércia de um dos réus, já que a estabilização só se justifica com a extinção do processo, e neste caso o processo continuará em trâmite. Porém, outra parte da doutrina entende que, nesse caso, somente se a defesa do litisconsorte que se insurgiu contra a decisão aproveitar ao réu que deixou de agravar a decisão, será possível afastar a estabilização da tutela. Quanto ao assistente, este pode, diante do silêncio do réu, insurgir contra a decisão concessiva de tutela antecipada antecedente, afinal, o art. 121, parágrafo único do NCPC, permite que o assistente simples atue na omissão do assistido, na qualidade de seu substituto processual. Caso o réu, entretanto, se manifeste expressamente a favor da estabilização, o processo será extinto e a tutela antecipada estabilizada.
  • Inexistência de coisa julgada: a opção do art. 304, § 6º do NCPC pela não ocorrência da coisa julgada é lógica e faz sentido, pois não se poderia conferir a mesma dignidade processual a um provimento baseado em cognição sumária e a um provimento lastreado na cognição plena. Ocorres, entretanto, que após o decurso do prazo de dois anos para o ingresso da ação prevista no 2º do art. 304 do NCPC, a concessão de tutela antecipada se torna imutável e indiscutível. Pode se dizer que não se trata de coisa julgada material, mas de um fenômeno processual assemelhado, mas a estabilidade e a satisfação jurídica da pretensão do autor estarão presentes em ambas.
  • Ação no prazo de 2 anos: art. 304, § 2o do NCPC. Qualquer das partes poderá demandar a outra com o intuito de rever, reformar ou invalidar a tutela antecipada estabilizada nos termos do caput. Haverá novo processo neste caso. A competência por prevenção neste novo processo, prevista pelo § 4º do art. 304 do NCPC, para o juízo que concedeu a tutela antecipada que se estabilizou, é de natureza absoluta, de caráter funcional.
    Obs.: este prazo de 2 anos possui natureza decadencial (Humberto Theodoro Júnior e Daniel Neves), apesar de entendimento que defende a inconstitucionalidade deste prazo sob o fundamento de que ter-se-ia uma incompatibilidade, na espécie, com o processo justo. Dessa maneira, mesmo depois do prazo de dois anos do art. 304, § 5º, continuaria “sendo possível o exaurimento da cognição até que os prazos previstos no direito material para a estabilização das situações jurídicas atuem sobre a esfera jurídica das partes”, como o que ocorre, por exemplo, através da prescrição, da decadência e da supressio.
  • Art. 304, § 3o do NCPC. A tutela antecipada conservará seus efeitos enquanto não revista, reformada ou invalidada por decisão de mérito proferida na ação de que trata o § 2o. Assim, a tutela antecipada que se estabilizou não pode ser atacada neste novo processo por meio de outra decisão de antecipação de tutela, mas tão somente por meio de decisão de mérito. Porém, há entendimento doutrinário diverso, entendendo cabível tutela provisória no caso, para que cessem imediatamente os efeitos da tutela antecipada.
  • Ação rescisória: há corrente que defende o afastamento do cabimento de ação rescisória contra a decisão que antecipa a tutela antecipada que se estabiliza, uma vez que, por expressa previsão legal, não há coisa julgada (art. 304, § 6º do NCPC). Entretanto, parte da doutrina vê uma saída possível para tal cabimento, fazendo uma interpretação ampliativa do § 2º do art. 966 do NCPC. Segundo este dispositivo legal, cabe ação rescisória contra decisão terminativa, desde que ela impeça a nova propositura da demanda ou a admissibilidade do recurso correspondente. A ausência de coisa julgada, portanto, teria deixado de ser condição sine qua non para a admissão de ação rescisória, o que poderia liberar o caminho para a conclusão de cabimento de tal ação contra a decisão que concede tutela antecipada estabilizada depois de dois anos de seu trânsito em julgado.

20 comentários sobre “TUTELA ANTECIPADA ANTECEDENTE E SUA ESTABILIZAÇÃO

  1. Prezados, boa noite.
    Hoje, por acaso buscando na internet algumas coisas sobre uma ação que pretendo entrar, me deparei com a riqueza deste blog, não sou advogado, mas me interesso muito pelo mundo jurídico
    porém não tenho condições financeiras para fazer uma faculdade de Direito.
    Quero apenas agradecer a todos que cooperam com este maravilhoso blog. Um grande abraço a todos.

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  2. Parabéns pela explicação. Só uma dúvida, caso seja indeferido o meu pedido TUTELA PROVISÓRIA ANTECIPADA EM CARÁTER ANTECEDENTE, eu posso emendar a inicial e requerer a tutela de urgência sobre novos argumentos?

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    • Obrigado Felipe!!!
      Partindo do pressuposto que já ocorreu a possibilidade de emenda nos termos do art. 303, § 6º (momento que não foi acolhida a tutela, mas também ainda não foi indeferida), entendo que depois de indeferido, no mesmo processo não é possível a renovação desse pedido, pois se fi indeferido o pedido o processo foi extinto. Portanto, deve haver nova petição inicial, com pagamento de novas custas, tratando-se de novos argumentos.

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  3. Olha, realmente, um excelente texto, muito produtivo; parabéns a você que fez esse resumo, foi bastante válido e proveitoso.
    Deua te abençoe sempre é sempre

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    • A tutela já se estabilizou, logo não há em que se falar em recurso, como visto poderá haver a reforma, invalidação ou ser revista através da ação própria dentro do prazo decadêncial de dois anos.

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  4. Bom dia!
    Após os dois anos, posso entrar com ação de declaratória de inexistência de débito, por exemplo, com danos morais? A ação tutela antecipada foi deferida e o meu nome foi excluído do SPC E SERASA.

    Att.,

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  5. Dr em um processo de manutencao e rentegracao de posse,onde em audiencia o advogado do reu perde o prozo de destemunhas e o juiz da sentecas ao autor, sem ouvir o reu . tem algum a se fazer ?? alem de fazer um recurso pedinto vista ao processo .

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  6. Dentre essas correntes apresentadas, existe alguma majoritária?
    Desde já agradeço.
    Att,
    Vanessa Morgado
    Estudante de Direito

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  7. Por gentileza só preciso de uma informação. Eu sou autor de uma ação e gostaria de saber quanto tempo leva para que o juiz conceda a Tutela Antecipada Antecedente.

    Essa ação foi protocolada no dia Maio de 2018 e ate agora nada de o juiz decidir

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